sexta-feira, 23 de abril de 2010

SUCESSÃO PRESIDENCIAL CONTAMINA O CARNAVAL EM CACHOEIRA

Há 88 anos o jornal cachoeirano A  ORDEM  publicava um artigo sobre o Carnaval na cidade. Uma leitura atual revela aspectos interessantes da folia naquela época, como a intensa programação das festas públicas e particulares, a utilização das duas filarmônicas  (as arquirivais Lyra Ceciliana Minerva Cachoeirana)  nos festejos de rua, os desfiles alegóricos de charretes,  os cordões carnavalescos, o consumo inocente de lança-perfume  (as marcas referidas  no artigo são Alice   e   Rodo Metálico ...) e a influência da  campanha eleitoral  para Presidente da República na grande festa. 


O Brasil vivia naqueles dias a efervescência  de uma campanha presidencial. Para suceder Epitácio Pessoa (1918-1922) alinharam-se dois candidatos. 

Do lado do governo estava o mineiro  Artur Bernardes, lançado  pelas oligarquias mineira e paulista, que há décadas se revezavam no poder, dentro da chamada política do café com leite (ora Minas, ora São Paulo, indicavam quem seria o presidente). Era o auge da chamada  República Velha). 

 Artur Bernardes


Uma dissidência lançou a candidatura do fluminense Nilo Peçanha (um mulato que já havia governado o Brasil entre 1909/1910 com a morte de Afonso Pena, de quem era vice-presidente). A composição em torno de Nilo Peçanha  ganhou o nome de Reação Republicana e reunia caciques políticos regionais insatisfeitos com a hegemonia mineiro-paulista na política brasileira. O candidato de oposição tinha apoio mais expressivos dos  governos do  Rio de Janeiro, Bahia, Pernambuco e Rio Grande do Sul

Nilo Peçanha

Ademais,  foi a campanha mais eletrizante que o Brasil já vira, com a participação intensa das massas urbanas, onde o nome de Nilo Peçanha tinha mais penetração. O candidato a vice-presidente de Nilo era  José Joaquim Seabra (o JJ Seabra), que paralelamente governava a Bahia. Pela Constiuição vigente à época (a de 1891) o vice-presidente da  República presidia o Senado. 



JJ Seabra

O clima eleitoral daquele ano contaminou o carnaval em Cachoeira. O jornal A ORDEM  pertencia a Durval Chagas, que  juntamente com Albino  Milhazes liderava o principal grupo político  local, alinhado a Seabra. Daí o jornal ter destacado com ênfase, ao final da reportagem, a letra de uma  marchinha  carnavalesca composta para atacar a candidatura de Artur Bernardes, chamado de Seu Mé pelos adversários. Outro apelido de Artur Bernardes era Carneiro.

A seguir, a íntegra do artigo em A ORDEM (25/02/1922) - 

   Clique na imagem para facilitar a leitura





O resultado final da eleição foi a vitória de Artur Bernardes, que em Cachoeira havia sido apoiado pelo deputado federal Ubaldino de Assis, adversário mortal de Durval Chagas e de JJ Seabra. A disputa política daquele ano  em Cachoeira foi cruel, tendo havido  inclusive um tiroteio  em plena Rua da Matriz, que resultou na morte de um funcionário dos Correios, vítima de uma bala perdida. Houve várias prisões e a polícia invadiu a casa de Ubaldino de Assis em busca de armas e dos "pistoleiros". A casa, na Rua da Matriz, chegou inclusive a ser saqueada e Ubaldino acusou Seabra, que também era o governador da Bahia, de perseguí-lo e à sua família. Achando-se em perigo de vida, abandona a política cachoeirana e muda-se para o Sul do Brasil. Era o fim da carreira política desse cachoeirano que teve grande prestígio nos governos de Hermes da Fonseca e do próprio Artur Bernardes e era amigo e correligionário de Octávio Mangabeira.

Uma curiosidade dessa eleição é que o vice de Artur Bernardes,  o maranhense Urbano Santos, que morreu antes de ser empossado. Rápido, JJ Seabra entrou na Justiça  pleiteando o cargo de vice-presidente da República, usando o esquisito argumento de que fora o segundo colocado na eleição... para vice-presidente !!!. Perdeu, claro. Naquele tempo, quem fosse eleito Vice-Presidente  da República era automaticamente  Presidente do Senado.

E Artur Bernardes enfrentou fortes reações, principalmente militares, antes e depois da posse. Para debelar as  insatisfações, revoltas, quarteladas  e ameaças de deposição governou com o Brasil sob estado de sítio, do primeiro ao último dia de seu mandato.